Nas últimas semanas, dois jornais brasileiros veicularam reportagens denunciando a exploração sexual de adolescentes do sexo masculino em grandes centros do país. O projeto que deu origem à série de reportagens sobre o tráfico e a exploração sexual dos adolescentes foi vencedor da categoria Jornal do 4º Concurso Tim Lopes para Projetos de Investigação Jornalística, realizado pela Childhood Brasil e pela ANDI, com o apoio do UNICEF, da OIT, da FENAJ e da ABRAJI.
Na série Adolescentes: traficados, explorados e invisíveis, publicada pelos jornais O Liberal e Amazônia, ambos do Pará, a denúncia foi feita a partir da rede de exploração que atrai meninos do estado para capitais como São Paulo, Rio de Janeiro e Curitiba. A seguir, você confere um pequeno resumo da série, que pode ser acessada clicando aqui.
Adolescentes: traficados, explorados e invisíveis
Adolescentes homoafetivos do sexo masculino estão sendo aliciados, escravizados, explorados sexualmente, roubados e, não raro, mortos por redes nacionais e internacionais de tráfico de pessoas. Os meninos são mortos em brigas de rua, baleados por abusadores ou devido a aplicações improvisadas de silicone industrial, usado para 'criar' seios, coxas grossas e glúteos. Belém é uma das capitais brasileiras que mais fornece vítimas a essas quadrilhas e de onde saem a maioria dos aliciadores, cafetinas e intermediários. Cidades como São Paulo (SP), Rio de Janeiro (RJ) e Anápolis (GO) e, mais recentemente, Curitiba (PR) estão lotadas de adolescentes paraenses sendo explorados sexualmente. Os primeiros contatos entre os meninos e as redes de tráfico acontecem quase que invariavelmente na rodovia BR-316, estrada federal que liga o Pará ao Nordeste do País, e nas transversais da avenida Almirante Barroso, uma das principais vias de acesso ao centro de Belém. Nesses locais não há um único adolescente que não tenha na agenda o nome e o telefone de um travesti adulto “que leve para São Paulo”. Inquéritos policiais e depoimentos dos próprios adolescentes indicam que as quadrilhas agem de modo organizado. Sempre há um contato local ligado a um intermediário - freqüentador da 'ponte aérea' Belém-São Paulo-Rio de Janeiro. João, adolescente traficado aos 16 anos, contou que os meninos 'trabalham' sem descanso. Entregam pedágios diários para 'funcionários' de aliciadores e são obrigados a pagar aluguéis altíssimos para morar amontoados em apartamentos sujos e insalubres. O depoimento revelou uma estrutura de vigilância diária e um esquema de escravidão por dívida e humilhação. “A gente chegava de manhã da rua e não podia descansar. Quem dormia, apanhava de cabo de vassoura”, contou o adolescente. As quadrilhas de aliciadores sabem o quanto frágeis podem ser os meninos que percebem ainda criança uma orientação homossexual. Para a psicóloga Sarah Baía, com experiência no acompanhamento de crianças e adolescentes vítimas de exploração sexual e tráfico, o preconceito empurra esses meninos para as redes de exploração. Durante anos de trabalho ouviu relatos de adolescentes desrespeitados pelos colegas e professores na escola e histórias de rejeição por pais e irmãos, que sentem vergonha. “Esses adolescentes não conseguem participar de nenhum grupo social que lhes forneça modelos positivos e respeite sua orientação”, explica. No final, é o aliciador quem aceita esse menino como ele é, que preenche o espaço que deveria ser da família, da escola ou até da igreja, outro grupo onde ele poderia ser aceito, mas não é. Vulnerável, ele não consegue perceber que há um interesse ruim nessa relação. O tráfico é potencializado pelo preconceito.