Programa Na Mão Certa

A importância da educação continuada

Com a realização dos workshops regionais em São Paulo e Curitiba, o Programa Na Mão Certa e as empresas signatárias do Pacto Empresarial iniciaram a implantação do Projeto de Educação Continuada. "Pontos Focais" e "Multiplicadores" receberam orientações sobre como colocar em prática as ações de enfrentamento à exploração sexual de crianças e adolescentes nas estradas. Nesta entrevista, o psicólogo Elder Cerqueira, um dos responsáveis pela pesquisa A vida do Caminhoneiro Brasileiro, comenta os resultados dos encontros e avalia os rumos do programa.

Elder Cerqueira é doutorando e mestre em Psicologia (UFRGS/ University of Nebraska, USA), psicólogo, professor da UFRGS, autor de diversos artigos e capítulos sobre desenvolvimento humano e sexualidade.

Na Mão Certa - Qual sua avaliação sobre o Programa Na Mão Certa?

Elder - O Programa Na Mão Certa marca a luta pelo fim da exploração sexual nas estradas brasileiras pelo seu caráter inovador, ao unir o terceiro setor à participação da iniciativa privada sem desconsiderar a colaboração de ações já existentes. Dessa forma, a iniciativa une forças e atua em diferentes frentes contra o problema. Nesta primeira etapa, destaca-se o investimento na educação continuada como estratégia de formação de agentes de proteção, valorizando o profissional dos transportes e não culpabilizando-o.

Na Mão Certa - Qual é a sua opinião sobre os workshops realizados em São Paulo e Curitiba?

Elder - A adesão das empresas ao Pacto Empresarial já foi um bom indicativo do compromisso com o Programa. A participação nos workshops só confirmou este compromisso e motivação. Profissionais experientes na área compartilharam com o Programa suas impressões sobre os materiais utilizados e confirmaram que estamos "dirigindo" na mesma direção. Avalio que houve uma boa aceitação das estratégias e materiais trabalhados nos encontros. Além disso, tratou-se de uma oportunidade de discutir a questão da responsabilidade social das empresas.

Na Mão Certa - Qual é a importância do multiplicador nesse processo?

Elder - O multiplicador é uma peça-chave no processo. Trata-se da pessoa que terá contato direto com o motorista, portanto, carrega a responsabilidade de transmitir o conteúdo do programa de maneira empática, mas ao mesmo tempo séria. Sabemos que a mensagem do programa foi muito bem produzida, mas a força e impacto de cada ação dependerá muito da relação estabelecida pelo multiplicador, construindo um relacionamento de confiança e respeito.

Na Mão Certa – A pesquisa A vida dos caminhoneiros brasileiros mostra que um grande número de profissionais admite algum tipo de envolvimento com a exploração. Por que isso acontece?

Elder - Os caminhoneiros têm um estilo de vida diferenciado, uma relação de identificação com a profissão muito marcante. Da mesma forma, seus comportamentos também podem ser diferenciados, uma vez que estão longe de alguns condicionantes sociais por longos períodos, além de criarem uma cultura própria do caminhoneiro, que se mostra mais permissiva em relação à sua vida sexual. Por exemplo, estes profissionais fazem uso de serviços sexuais de prostitutas com uma freqüência elevada. Assim, cria-se um ambiente no qual a exploração sexual pode acontecer e até passar despercebida, naturalizada, já que não é um fenômeno muito questionado dentro desta cultura. A pesquisa mostra que os homens que costumam sair com prostitutas adultas têm maior probabilidade de se tornarem clientes da exploração sexual de crianças e adolescentes, mesmo que seja de forma esporádica.

Na Mão Certa – Como reverter esse quadro?

Elder - Acredito que o Programa Na Mão Certa começa da maneira adequada, investindo em educação. Trata-se da tentativa de mudança de comportamento desses homens. Assim, devem-se trabalhar alguns valores e padrões culturais desta classe profissional. Considera-se também que alguns caminhoneiros podem se tornar agentes de proteção, conversando com colegas, posicionando-se contra a exploração e informando. No entanto, o próprio Programa considera que outras ações devem ser reforçadas, com atuação com as próprias meninas e suas famílias.

Na Mão Certa – Qual é o papel das empresas?

Elder - Elas têm papel fundamental na atuação junto aos seus profissionais. Como os próprios caminhoneiros costumam dizer, "o motorista é o cartão de visita da empresa". Ele leva o caminhão e o nome da empresa por todo o país. Além do mais, há o compromisso com a responsabilidade social. Deve-se ressaltar que a vinculação das empresas ao Programa Na Mão Certa não deve ser uma ação de marketing ou filantropia. Trata-se de uma ação de responsabilidade.