Programa Na Mão Certa

“Índice Fora das Sombras”: como 60 países estão lidando com o abuso e a exploração sexual de crianças e adolescentes


Fotos: Romero Cruz | Danilo Ramos


Rute Caldeira, da Ignite Philanthropy, apresentou o estudo “Índice Fora das Sombras”, que mostra como 60 países estão lidando com o abuso e a exploração sexual de crianças e adolescentes.

Entender o cenário da violência sexual contra crianças e adolescentes no mundo – e como o Brasil se insere nele - pode contribuir para a atuação de empresas, sociedade civil organizada e governos na definição de políticas públicas que levem a mudanças estruturantes. Há poucas pesquisas sobre este assunto e uma nova e importante referência global para a atuação da Childhood Brasil é o “Out of the Shadows Index”, ou “Índice Fora das Sombras”, estudo que analisou como 60 países estão lidando com o abuso e a exploração sexual de crianças e adolescentes.

Iniciativa da Ignite Philanthropy, o levantamento é desenvolvido pela The Economist Impact, que avalia como esses países, que juntos representam aproximadamente 85% da população mundial de crianças e adolescentes, estão, a partir de um conjunto de indicadores, “prevenindo” a violência sexual e “respondendo” a ela. Os resultados da edição lançada em setembro foram apresentados pela pesquisadora portuguesa Rute Caldeira, responsável pela pesquisa na Ignite Philanthropy, no “16º Encontro Anual Na Mão Certa”.

“Como ainda há muito preconceito em falar sobre violência sexual de crianças e adolescentes, a nossa intenção, ao tirar o tema das sombras, é criar uma ferramenta que, de forma objetiva, foque em evidências, gerando mais conscientização e, também, aponte soluções. Assim, ao monitorar o progresso de um país, o estudo enfatiza a capacidade real dos governos para prevenir e dar respostas a casos de violência sexual contra crianças e adolescentes”, explicou Rute. Para ela, isto é fundamental, porque são os governos que, em último caso, são os responsáveis por agir e, também, os atores para os quais as empresas e a sociedade podem fazer demandas.

O Brasil ficou em 11º lugar na avaliação geral dos 60 países - nos primeiros lugares estão Inglaterra, França, Suécia, Canadá e África do Sul. Ao ser avaliado em relação à prevenção, o Brasil ficou em 25º. Em relação à resposta, em 5º lugar, posições que mostram os importantes desafios do País para o estabelecimento e execução de medidas pra enfrentar a violência sexual de crianças e adolescentes.

Para que a classificação do Brasil fosse mais bem compreendida, Rute explicou os critérios que definem os cerca de 200 indicadores utilizados pelo Índice e que permitem comparações entre os 60 países.

Em relação à prevenção abrangem:

- POLÍTICAS E PROGRAMAS: iniciativas governamentais e obrigatórias de um país consideradas preventivas de casos de exploração e abuso sexual de crianças e adolescentes, abrangendo fatores de risco econômicos, sociais e ambientais que podem aumentar a suscetibilidade de casos.

- LEGISLAÇÃO DE PROTEÇÃO: grau de proteções legais ou regulações sobre violência sexual de crianças e adolescentes.

- CAPACIDADE E COMPROMISSO NACIONAL: grau de comprometimento em entender a escala do problema e construir quadro mais eficaz de prevenção.

 

Já em relação à capacidade dos governos de responder, os indicadores abrangem:

- SERVIÇOS DE SUPORTE E RECUPERAÇÃO: sistemas de apoio governamental e não governamental (saúde física e mental, reabilitação, etc.) para vítimas violência sexual.

- PROCESSO DE JUSTIÇA: capacidade do sistema de justiça de lidar com os casos, mantendo o princípio do melhor interesse da criança.


Segundo Rute, estes pontos ajudam a entender as variações de posição do Brasil e, também, por que os países mais ricos, maioria entre os Top 10 do ranking geral, normalmente têm performance mais forte em prevenção, do que em resposta. “A hipótese é que, por terem uma prevalência menos elevada, esses países não são tão desafiados a criarem programas de resposta. Já os países que sobem no ranking de resposta, como o Brasil, provavelmente têm níveis de prevalência mais elevados, historicamente, e com isso, aprenderam a desenhar políticas, regulamentações e programas para dar resposta a casos de abuso sexual e exploração de crianças e adolescentes”, afirmou.

Estudo do setor privado – Paralelamente ao Índice Geral, foi realizado de forma pioneira um estudo sobre o setor privado, com o objetivo de medir como os governos desses 60 países regulamentam as empresas em relação às medidas de prevenção e enfrentamento da violência sexual de crianças e adolescentes. Neste recorte, o Brasil ficou em 16º, a partir da avaliação de um conjunto de quatro macro indicadores:

1 - REDUÇÃO DE FATORES DE RISCO NO LOCAL DE TRABALHO: grau da legislação sobre verificação de antecedentes criminais de empregados, regulamentação do trabalho de jovens aprendizes e proteção de adolescentes e jovens em locais de trabalho.

2 - PREVENÇÃO DE AMEAÇAS ON-LINE: nível de implementação de leis de proteção e processamento de dados que protegem o bem-estar de crianças e adolescentes.

3 - PREVENÇÃO ESPECÍFICA SETORIAIS: disposições especificas para cada setor produtivo que tenha contato direto com crianças e adolescentes.  

4 - RESPOSTA E COOPERAÇÃO DO SETOR PRIVADO: até que ponto provedores de serviços de internet e empresas são obrigados a colaborar ou receber sanções por violência sexual contra crianças e adolescentes em locais de trabalho.


Na avaliação de Rute, uma as principais conclusões deste relatório do setor privado, considerado pouco otimista por ela, é que as estruturas regulatórias, no geral, são inadequadas ou bastante fracas: “Não existe um país com performance excelente. Além disso, o on-line, que tem potencializado o impacto negativo dos casos de abuso sexual de crianças e adolescentes, é uma grande preocupação.”

Diante dos indicadores apresentados e concluindo a apresentação, Eva Dengler, Gerente de Programas e Relações Empresariais da Childhood Brasil, apontou possibilidades de atuação para tirar a violência sexual de crianças e adolescentes para “fora das sombras”. O primeiro deles é potencializar as parcerias entre a organização e empresas já comprometidas com esta causa, voluntariamente, mesmo sem a existência de uma legislação sobre a prevenção.

“Além disso, os resultados do trabalho da Childhood Brasil com o setor privado têm o potencial de contribuir como referência para a formulação de políticas públicas. E, também, podemos contribuir, com a nossa experiência em diversos setores, como o de transporte e logística e os grandes empreendimentos, para ampliar estudos como o Índice Fora das Sombras. Assim, deixo uma pergunta a vocês: de tudo que conhecem do Programa Na Mão Certa e dos outros programas da Childhood Brasil, como podemos avançar com o setor privado?”, finalizou.



✔ Assista ao Painel sobre o “Índice Fora das Sombras”



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